domingo, 8 de novembro de 2015

Ataques virtuais têm punição

 
Rosângela Gouvêa, titular da Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e HomofóbicosRosângela Gouvêa, titular da Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos
Difamação, ofensas e ataques discriminatórios ocorridos no ambiente virtual ganharam destaque nos últimos dias, quando a atriz Taís Araújo foi alvo de comentários racistas na própria página no Facebook. Como ela, o psicólogo paraense Raphael Negrão também foi atacado pela internet. No Estado, a Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos investiga esse tipo de ocorrência. Identificar os culpados não é simples, mas a polícia destaca que a internet não garante anonimato aos criminosos.
Raphael Negrão, de 26 anos, foi ofendido por uma tia do ex-namorado em uma conversa pela internet e decidiu compartilhar o conteúdo numa rede social. “Num primeiro momento a gente fica triste. Eu nunca tinha passado por esse tipo de situação, nunca passei por isso na minha família. Além da tristeza, também dá medo de encontrar esse tipo de pessoa na rua. É muito complicado imaginar que você pode ser atingido por isso. Na época que ela mandou as mensagens, eu não sabia nem de quem se tratava, não sabia nem da existência dela. Depois que tudo aconteceu eu decidi publicar no Facebook para saber o que as pessoas pensavam daquilo. O conteúdo viralizou na rede, após seis meses de agressões seguidas”, explicou a vítima.
A agressora chamou Raphael de “doente” por ser homossexual e disse que ele deveria ser queimado. A mulher foi processada por danos morais em junho de 2012. O caso já foi julgado e a decisão foi pelo reconhecimento do dano sofrido pelo psicólogo. O valor da indenização não foi revelado, e a vítima aguarda o cumprimento da decisão.
O psicólogo relembra que, quando compartilhou na rede o que estava vivendo, recebeu apoio de centenas de pessoas. “Receber o apoio das pessoas é sempre muito importante, não estar sozinho na luta. Quando eu me vi sendo apoiado, a quantidade de mensagens que eu recebi de apoio foi muito importante. Ainda hoje vi um caso de um rapaz que se suicidou porque a família não aceitou, por não gostar dele do jeito que ele era. Nós, como sociedade, perdemos muito por esse tipo de mentalidade que é difundida por algumas pessoas. Não por nenhuma religião, pois religião alguma diz que a gente tem que maltratar alguém, são determinadas pessoas que propagam esse tipo de coisa. Vivemos numa cultura muito machista”, lamenta.
Ofensas cara a cara ainda são mais comuns
Quem é condenado por homofobia não vai para a prisão, mas deve pagar indenização. De acordo com a titular da Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos, delegada Rosângela Gouvêa, o Código Penal prevê discriminação por raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou com deficiência. “Com relação à orientação sexual, o legislador não a colocou nesse rol. Entretanto, eles não estão desamparados, fazemos um procedimento de TCO (termo circunstanciado de ocorrência). Portanto, não há impunidade”, afirma.
Ainda segundo Rosângela Gouvêa, os casos de ofensas cara a cara ainda são os mais comuns na delegacia. Há, em média, 20 ocorrências por mês, e a maior parte é de injúria racial. “A maioria é de demanda presencial, mas há casos que foram investigados em que o agressor usou e-mail. Tem um caso que eu apurei de um empresário que enviou mensagens ofensivas para um advogado paraense que ele contratou. Ele fez um contrato de honorário e passou a não cumprir, não pagou o advogado. Quando a vítima fez a cobrança, o empresário começou a enviar e-mail. Um dia enviou 20 mensagens dizendo que todo paraense era burro e que o Pará era sucursal do inferno. Nesse caso, conseguimos identificar e chamar o empresário. Fizemos o inquérito. Concluir o caso é motivo de satisfação”.
A delegacia também investiga comentários publicados na internet durante o jogo entre Paysandu e Fluminense, em agosto. Os torcedores do Paysandu foram chamados de “índios” como forma de ofensa, num post no Facebook. A ocorrência é investigada como racismo. “Nos casos de racismo não é necessário ter autorização de nenhum paraense. Por ser uma ação pública, eu trabalho sem a necessidade de representação”, diz Rosângela Gouvêa.
Injúria racial x racismo
 Embora impliquem em responsabilidade penal, os conceitos jurídicos de injúria racial e racismo são distintos. O primeiro está previsto no Código Penal e o segundo, na Lei n. 7.716/1989. A injúria racial consiste em ofender a honra de alguém com base em elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem, já o crime de racismo atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos, nesse caso, discriminando a integralidade de uma raça. O crime de racismo é inafiançável e imprescritível.
 “A injúria racial ofende uma figura determinada e está prevista no CP (Código Penal), já o crime de racismo não ofende uma pessoa, mas uma comunidade ou coletividade. A penalidade é de um a três anos (de prisão). Nesses dois casos é feito o inquérito policial. Já nos casos de discriminação por orientação sexual, por não existir previsão legal, é feito um TCO (termo circunstanciado de ocorrência)”, explica a delegada Rosângela Gouvêa.
Universitário acusa dono de hotel de racismo e homofobia
O universitário Henrique Noronha usou uma rede social para denunciar agressão, racismo e homofobia supostamente sofridos no hotel Crowne Plaza, em Belém. O caso tramitou para a Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos, mas é preciso que a vítima vá até lá para que ele seja investigado. A delegada titular da unidade explica que, diferente dos casos de racismo, nos crimes de injúria é necessária a autorização da vítima.
“Ele (Henrique Noronha) tem que procurar a delegacia para que a autoridade possa trabalhar. O boletim de ocorrência foi feito em São Brás, mas tramitou para a delegacia. É uma questão de discricionariedade da vítima. Se ela não quer, o Estado não tem que como obrigar, diferente do crime de racismo. Estamos aguardando ele se dirigir à delegacia para tomar o depoimento. Os casos de injúria precisam de autorização da vítima, diferente do crime de racismo. É preciso um termo de representação da vítima, uma autorização para que a autoridade policial possa realizar o inquérito policial”, explica a delegada Rosângela Gouvêa.
Breno Silva, estudante de Psicologia da Universidade Federal do Pará (UFPA), disse ao G1 Pará que testemunhou as ofensas contra Henrique. Ele contou que viu quando Henrique estava sentado e foi abordado pelo dono do hotel, que chegou acompanhado de seguranças. “Ele [o dono do hotel] intimidou e deu uma cotovelada na lombar, e puxou o celular da mão do rapaz. Disse que no hotel dele ninguém roubava. Os seguranças o levaram para fora do hotel puxando pelo braço. O rapaz já lá fora, o dono do hotel ficou xingando: ‘Deve ser um favelado, um nordestino, um viadinho, pra vir aqui roubar o meu hotel’. Havia um grupo de prováveis amigos e parentes do dono que viram tudo afastados e não se meteram em confusão”. Silva diz que não quer que o crime fique impune e que está disposto a testemunhar em uma futura audiência. (Pararijos NEWS).

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