domingo, 16 de agosto de 2015

Prefeitura acolhe a população de rua




Um estudo da Universidade Federal do Pará (UFPA), divulgado em 2014, aponta que há cerca de 500 pessoas vivendo em situação de rua na capital e na Região Metropolitana de Belém(RMB). Na capital, é comum que essa população se concentre em bairros como Comércio e São Brás, distrito de Icoaraci e na região do Entroncamento, explica a Fundação Papa João XXIII (Funpapa), órgão do município que cuida da assistência social e oferece diferentes serviços a essa população.
De acordo com o Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, esse grupo populacional é bastante heterogêneo e possui em comum a pobreza extrema. Os vínculos familiares estão fragilizados ou rompidos e não existe a moradia convencional regular.
Essa população em situação de rua se evidencia pela utilização de logradouros públicos como praças, jardins, canteiros, marquises, viadutos; e áreas degradadas, tais como prédios abandonados, ruínas, carcaças de veículos e outros que fazem espaço de moradia e de sobrevivência, de forma temporária ou permanente. Utilizam, também, unidades socioassitenciais de acolhimento para pernoites temporários ou moradia provisória.
Na capital, a Funpapa atende as pessoas em situação de rua de acordo com a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, no interior da Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade. Para tanto, oferta o Serviço Especializado em Abordagem Social, desenvolvido em cinco Centros de Referência Especializada de Assistência Social (Creas); o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua, executado em dois Centros POP - um em São Brás e outro no Distrito de Icoaraci; e ainda o Serviço de Acolhimento Institucional, em dois espaços de acolhimento - um no bairro de Nazaré (Camar I) e outro no bairro do Reduto (Camar II).
ADOTIVA
Edna dos Santos, de 38 anos, foi abordada na avenida Pedro Miranda, na Pedreira, ao lado de uma oficina mecânica. Aos 18 anos, saiu de casa pela primeira vez e perdeu todas as referências familiares. “Fui morando de casa em casa todo esse tempo. Sempre conto com a ajuda de um e de outro. Agora estou há um mês na rua. Sou filha adotiva e perdi o contato com a minha família. Na verdade, nem quero mais ter contato com eles”, contou.
No final do mês de julho, os chamados educadores sociais de rua do Serviço Especializado em Abordagem Social, Larissa Gomes e Éden Oliveira, que trabalham no Creas “Manoel Pignatário”, localizado no Marco, conheceram o caso de Edna. Foi Larissa quem iniciou a conversa com a moradora de rua. “Estamos aqui para te ajudar, para que você não fique aqui correndo risco. Também podemos fazer um trabalho para tentar encontrar sua família”, disse a educadora. Foram cerca de 30 minutos de diálogo. Edna não aceitou o encaminhamento da equipe, mas recebeu todas as informações sobre como conseguir ajuda.
Já Isaque da Silva, de 49 anos, saiu de casa aos 34 por causa de conflitos familiares ocasionados pelo consumo excessivo de álcool. “Já são 15 anos nessa realidade difícil. A rua não é boa e nunca vai ser, principalmente para quem tem problemas com álcool e drogas. Já vi de tudo: prostituição, morte, gente se drogando. Lutei muitos anos para me livrar do vício. Consegui, mas tudo o que perdi na vida foi por causa do vício”, relata.
A mudança para Isaque começou há um ano, no Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), no bairro de São Brás. “Lá fora eu não tinha a atenção que tenho aqui. É uma esperança. Hoje consigo pensar em reconstruir minha família um dia”, acredita.
O Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua faz um trabalho técnico de análise das demandas dessa população. A partir daí, entram em cena as orientações individuais e grupais, os encaminhamentos a outros serviços socioassistenciais, às políticas públicas e aos órgãos de defesa de direitos.
A educadora social de rua Rita Rodrigues, que acompanha Isaque no plano de estratégia para saída das ruas, explica: “No caso específico do seu Isaque, ele já avançou muito. Um exemplo de que a política dá certo. Hoje, ele faz tratamento médico, retirou a segunda via dos documentos perdidos, tem acompanhamento psicossocial e agora estamos aguardando a resposta quanto ao serviço previdenciário (INSS), que solicitamos por conta da doença”.
O Espaço de Acolhimento Camar II é o novo convívio e endereço de referência para a dona Edilene da Silva, 49 anos. Natural da cidade de Fortaleza, no Ceará, ela veio ainda muito nova para Belém e começou a trabalhar como vendedora ambulante no bairro da Cabanagem. Após ser diagnosticada com tuberculose em fase avançada, precisou ser internada para tratamento. “Depois que tive alta, não tinha pra onde ir. Meu contato com meus filhos era muito pouco e minha casa foi roubada. Perdi tudo e me trouxeram para cá. Agora a minha casa é aqui e estou bem assim”, diz ela.
DROGAS
Segundo a coordenadora municipal da Referência Técnica em Saúde Mental, Viviany Cardoso, pesquisa feita pela Universidade Federal do Pará, em 2014, apontou que 89% da população em situação de rua faz uso abusivo de drogas. Ela explica que, para atender as demandas das pessoas em situação de rua, a Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) tem uma equipe de Consultório na Rua, composta de médico, assistente social, psicólogo, técnico de enfermagem e motorista, que percorrem os bairros da Campina e Cidade Velha, prestando assistência médica e social aos moradores de rua.
Com uma rotina de atendimento, o Consultório na Rua já ganhou a confiança das pessoas em situação de rua. O horário de atendimento é variado para que o máximo de pessoas tenha acesso ao serviço de saúde.
O consultório é completo. Tem médico, psicóloga, assistente social e técnico de enfermagem, dispensação de medicamentos, receituário, curativo e muita disposição para ouvir e acolher quem precisa.
“Nosso trabalho tem dois pilares: o mapeamento do território de atuação e o atendimento centrado na pessoa. Isso significa que temos a cartografia das áreas que atendemos e não vamos a esses locais somente para medicar o diabetes ou a sífilis. Vamos conhecer  e entender esse indivíduo dentro do seu meio, da sua comunidade e o entendimento que ele tem de si próprio”, explica o médico do consultório, Vitor Nina.
Há mais de um ano implantado no município, o consultório teve como primeiro desafio vencer a desconfiança da população de rua. “Hoje, já encostamos o carro e esperamos a aproximação deles. Vamos atendendo conforme eles se organizam. Fazemos uma análise para definir as necessidades de cada paciente”, completa a assistente social do projeto, Eliane Guimarães.
Em média, são atendidas 12 pessoas diariamente em consultas médicas e oito para atendimento psicossocial. O consultório está vinculado à Unidade Municipal de Saúde do Jurunas e tem parceria com o Núcleo de Artes e Imanências em Saúde da Universidade Federal do Pará (Naris/UFPA).
“Esta gestão assumiu o compromisso de olhar para a população de rua, que até pouco tempo estava totalmente desassistida. Estruturamos os serviços e atendemos a um clamor social de cuidar também dessas pessoas. Dentro de todos os serviços, procuramos, sobretudo, garantir os direitos da população em situação de rua, como a emissão de documento e cadastramento para acesso a benefícios sociais”, pontua Viviany.
CAPS
Em breve, Belém terá mais dois Consultórios na Rua, com previsão de implantação até o final do ano. “É um avanço muito grande. Somados aos consultórios, teremos também mais dois Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e uma Unidade de Acolhimento Infantojuvenil”, ressalta a coordenadora.
Aliás, os Caps são peças fundamentais para o acolhimento e tratamento da população em situação de rua. Atualmente, o município possui quatro Caps municipais e cinco estaduais. São centros especializados, de portas abertas para todas as pessoas que necessitarem de atendimento psicossocial.
“Dentro dos nossos centros temos um acolhimento diferenciado, com oficinas terapêuticas e atendimento individual ou em grupo. O tratamento depende de muitos fatores, sobretudo da constância e da adesão. Sempre trabalhamos na perspectiva de redução de danos ao usuário”, acrescenta Viviany.
Há três meses internado na Unidade de Acolhimento Municipal, Carlos Barbosa, 44 anos, que outrora foi palhaço e fez muita gente sorrir, hoje encara a luta para vencer as drogas.
Natural de São Joaquim da Barra, interior de São Paulo, ele chegou a Belém há um ano e seis meses. Em abril deste ano aceitou o convite do médico Vitor Nina, da equipe do Consultório na Rua, para ir ao Caps AD, que trata de dependentes químicos. Aceitou e, no dia seguinte, foi para o local.
“Cheguei ao Caps e vi toda a equipe interessada no meu caso. Vi a luz no fim do túnel, um porto seguro para o meu barco à deriva. Todos os profissionais me ajudaram como pessoa e como um usuário que faz uso problemático de drogas. Antes eu era um caso social, depois virei um caso de polícia e hoje sou um caso de saúde”, resume Carlos, cujas mudanças físicas são visíveis. Desde que chegou ao Caps, ele já engordou 13 quilos.
A Prefeitura também lançou, em junho do ano passado, o programa Pacto do Acolhimento “Belém pela Vida”, que procura garantir ações articuladas desde a prevenção, busca ativa de pessoas em situação de rua, até a internação de dependentes químicos. Desde a sua criação, o Pacto já encaminhou mais de 1.200 pessoas para atendimento nas redes de saúde, assistência e de geração de emprego e renda no município, e mais de 150 foram conduzidas às unidades terapêuticas conveniadas, que estão localizadas em Mosqueiro e nos municípios de Santa Izabel e Castanhal, nordeste do Estado. O programa conta com o apoio da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). “Nossa função, no programa, é articular os serviços para que trabalhem de forma integrada. Esse é nosso grande eixo”, explica a secretária executiva do Pacto Belém pela Vida, Maria Malheiros.
(Pararijos NEWS)

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